sexta-feira, 30 de julho de 2010

História das mães que perderam seus meninos



Entre 1976 e 1983, durante o sangrento regime militar que se instalou na Argentina, cerca de nove mil pessoas desapareceram. Segundo organismos de direitos humanos, este número sobe a mais de 30 mil. Ao sequestro dos opositores, seguia-se o assassinato. Aviões partiam lotados de presos, que eram atirados ao Rio da Prata. Sem notícias de seus filhos, mães desesperadas percorriam delegacias, igrejas e prisões a procura de um simples sinal de vida. A partir de abril de 1977, todas as quintas-feiras às 15h30, as mães de alguns destes desaparecidos começaram a se reunir na Plaza de Mayo em frente à Casa Rosada, sede do governo.



A Praça foi escolhida como ponto de encontro porque, segundo a líder Hebe de Bonafini: “Lá todas as mães eram iguais, todas haviam percorrido os mesmos caminhos na mesma busca, não havia nenhuma diferença e nenhum tipo de distanciamento”. Começava ali um movimento de protesto e solidariedade unindo estas mães que perderam seus meninos. A intenção era sensibilizar o então presidente Jorge Videla, para que ele interviesse no processo e lhes fornecesse notícias dos filhos. Exigiam, ao mesmo tempo, punição para os assassinos.

“Os filhos mortos pariram as mães”

No início eram 14 mães, mas o grupo se expandiu, chegando a contar com milhares de participantes. Seguindo uma tradição, as mães argentinas guardam algumas fraldas de seus filhos como lembrança. As Mães da Plaza de Mayo passaram a usá-las, então, como marca registrada.



Cada mãe portava um pano branco na cabeça com o nome de seu filho desaparecido. As mães passaram a ser chamadas “loucas da Plaza de Mayo” Muitas mulheres adoeceram e morreram, foram repudiadas, perseguidas, abandonadas por seus maridos. Em dezembro de 1977, Azucena Villaflor De Vicenti, a primeira líder das mães, foi seqüestrada e assassinada pelos organismos repressivos da ditadura militar. Durante a Copa do Mundo de 1978, realizada na Argentina, a imprensa internacional que cobria o evento tomou conhecimento da existência da ação das Mães, que a ditadura tentava abafar por todos os meios. Houve o recrudescimento da repressão e num gesto de coragem e revide, as mães criaram oficialmente sua Associação em 22/8/1979.

Novamente o futebol foi usado como anestesia geral: a Argentina sediou o Mondialito de 1980, articulação da ditadura para desviar atenção do problema. Incansáveis, as Mães voltaram à Praça e criaram seu primeiro boletim. Nesse momento a opinião pública internacional já estava conscietizada do drama dos desaparecidos. Perante a omissão do governo argentino um grupo de apoio foi criado na Holanda. Este grupo custeou as despesas de instalação do primeiro escritório da Associação. Em 1981 freiras acompanharam as mães num primeiro jejum coletivo de protesto. A Guerra das Malvinas, em 1982, foi outro momento importante de ação. As Mães se declararam solidárias com as mães dos soldados argentinos.

Surgiram o primeiro jornal, as equipes de assistência psicológica e jurídica. “Enquanto houver um só assassino pelas ruas, nossos filhos viverão para condená-lo por nossas bocas.” Hebe de Bonafini.



1985 ficou marcado como o ano da “Marcha das Mãos Dadas”. O movimento foi encampado pela opinião pública no exterior. Depois, milhares de mãos argentinas se uniram na Avenida de Mayo e na Praça, pressionando o governo a dar uma solução final ao drama. Uma segunda manifestação comovente, a “Marcha dos Panos Brancos” ajudou a apressar o que foi chamado de “Ponto Final”: nos primeiros meses do Governo Alfonsin começaram a chegar telegramas, dizendo em que cemitérios estavam enterrados os jovens desaparecidos. Algumas receberam restos humanos como se fossem de seus filhos. As mães se recusaram a aceitar tortura moral das exumações sem que os assassinos tivessem sido punidos. O governo ofereceu ressarcimento econômico e homenagens póstumas. As mães recusaram o dinheiro e as honras, mas continuaram a luta.



Acesse o site da Associação das Mães da Plaza de mayo
http://www.madres.org/

Texto: Thereza Pires
Fotos: Têmis Nicolaidis e Gustavo Türck da Catarse - Buenos Aires, janeiro de 2010

Nenhum comentário: