A realidade encontrada: professores cansados por exercerem uma função que não lhes pertence. Educar crianças negligenciadas, abandonadas pelos pais fisicamente presentes. Crianças cuja infância roubada retrata uma realidade assustadora, porque o futuro que se vislumbra é a da delinqüência precoce, da drogadição, da exploração sexual, do abandono social.
O que emerge desta realidade escolar cotidiana?
Em relação às crianças: uma escuta inútil, falta de limites, de respeito e relações entre si tensas, agressivas, de submissão pelo medo.
A convivência cotidiana vai explicitando a sexualidade precoce exacerbada pela dança da “garrafa”, do “créu”, dos bailes “funk”. Neste comportamento aparece a adultilização precoce e a infância roubada. Estas crianças confrontadas com uma brincadeira comum, como construir barcos de papel, retomam o lado da infância e se surpreendem que elas mesmas podem construir brinquedos condizentes com sua idade. No entanto, esta experiência não faz parte de seu cotidiano, logo, retomam aquilo que lhes é familiar – a agressividade, a necessidade de serem confirmadas, não importa se pelo lado negativo ou positivo.
Em relação aos pais: jovens cansados, dependentes do álcool ou das drogas. Mães, profissionais do sexo, com muitos companheiros. Sem “braços” para os abraços. Sem escuta para ouvir, sem olhos para ver. “Clientes” passivas de programas governamentais. Acostumadas a receber. Olhadas pela necessidade básica a ser suprida. Eternas “vítimas”, eternas “clientes”, esquecidas de sua condição de sujeitos de direitos. Passividade consolidada pela falta – pelas expressões da Questão Social que, desde que nasceram, dão sustentação a suas vidas.
Em relação aos professores: cansados pela energia em tentar controlar o incontrolável – a falta de tudo.
Como ensinar quando se tem que manter a disciplina a qualquer custo? Como ensinar quando os cadernos são esquecidos, quando a inquietude retrata a negligência, o abuso sexual, a violência familiar? Como ensinar quando a escuta inútil não permite o socorro? Como ensinar quando este coletivo de professores caminha sozinho, sem que lhes seja oportunizado o cuidado para o enfrentamento a uma realidade de desesperança?
Em relação às políticas públicas: desarticuladas, centradas no dar, sem sentido de totalidade. Caminham juntas, mas paralelamente. Não se cruzam, logo, contribuem para a desesperança.
Como a execução de uma política de habitação pode pensar em construção de moradia a partir de um quadrado? Se planeja uma “cancela” sem muitos gastos. Não se pensa nos sujeitos, moradores. Espaços propícios para a violência, para o abuso sexual, para a promiscuidade. A ótica do direito, na execução, é quase sempre descartada.
Logo, falar em violência, em construção de mais presídios, sem prevenção, é trazer para o contexto uma fala vazia, porque desprovida do compromisso, do sentido do humano, que a sociedade capitalista é tão pródiga em produzir.
Assistente Social Maria da Graça Maurer Gomes Türck