segunda-feira, 24 de novembro de 2008

CRIANÇAS MALTRATADAS: UMA REALIDADE PERVERSA

Uma escola de periferia, de uma cidade do interior do RS, com alunos até a 4ª série do ensino fundamental. Uma estrutura física boa, aberta, com uma sinergia estrutural de acolhimento.

A realidade encontrada: professores cansados por exercerem uma função que não lhes pertence. Educar crianças negligenciadas, abandonadas pelos pais fisicamente presentes. Crianças cuja infância roubada retrata uma realidade assustadora, porque o futuro que se vislumbra é a da delinqüência precoce, da drogadição, da exploração sexual, do abandono social.

O que emerge desta realidade escolar cotidiana?

Em relação às crianças: uma escuta inútil, falta de limites, de respeito e relações entre si tensas, agressivas, de submissão pelo medo.

A convivência cotidiana vai explicitando a sexualidade precoce exacerbada pela dança da “garrafa”, do “créu”, dos bailes “funk”. Neste comportamento aparece a adultilização precoce e a infância roubada. Estas crianças confrontadas com uma brincadeira comum, como construir barcos de papel, retomam o lado da infância e se surpreendem que elas mesmas podem construir brinquedos condizentes com sua idade. No entanto, esta experiência não faz parte de seu cotidiano, logo, retomam aquilo que lhes é familiar – a agressividade, a necessidade de serem confirmadas, não importa se pelo lado negativo ou positivo.

Em relação aos pais: jovens cansados, dependentes do álcool ou das drogas. Mães, profissionais do sexo, com muitos companheiros. Sem “braços” para os abraços. Sem escuta para ouvir, sem olhos para ver. “Clientes” passivas de programas governamentais. Acostumadas a receber. Olhadas pela necessidade básica a ser suprida. Eternas “vítimas”, eternas “clientes”, esquecidas de sua condição de sujeitos de direitos. Passividade consolidada pela falta – pelas expressões da Questão Social que, desde que nasceram, dão sustentação a suas vidas.

Em relação aos professores: cansados pela energia em tentar controlar o incontrolável – a falta de tudo.

Como ensinar quando se tem que manter a disciplina a qualquer custo? Como ensinar quando os cadernos são esquecidos, quando a inquietude retrata a negligência, o abuso sexual, a violência familiar? Como ensinar quando a escuta inútil não permite o socorro? Como ensinar quando este coletivo de professores caminha sozinho, sem que lhes seja oportunizado o cuidado para o enfrentamento a uma realidade de desesperança?

Em relação às políticas públicas: desarticuladas, centradas no dar, sem sentido de totalidade. Caminham juntas, mas paralelamente. Não se cruzam, logo, contribuem para a desesperança.

Como a execução de uma política de habitação pode pensar em construção de moradia a partir de um quadrado? Se planeja uma “cancela” sem muitos gastos. Não se pensa nos sujeitos, moradores. Espaços propícios para a violência, para o abuso sexual, para a promiscuidade. A ótica do direito, na execução, é quase sempre descartada.

Logo, falar em violência, em construção de mais presídios, sem prevenção, é trazer para o contexto uma fala vazia, porque desprovida do compromisso, do sentido do humano, que a sociedade capitalista é tão pródiga em produzir.

Assistente Social Maria da Graça Maurer Gomes Türck

2 comentários:

Andréia disse...

A violação de direitos da criança e adolescentes é permeado por uma história cheia de negação e conflito. Este contexto vivenciado por estas crianças, não pode ser mais vistos com indiferentes olhares, pois é necessário principalmente saber escutá-las entendendo o processo pelo qual estas vivenciam, saindo do lugar onde geralmente costuma-se ficar, desarmando-se das próprias concepções de valores e moralidade.
Diante deste contexto verifica-se que a questão social se manifesta no codiano destas crianças através de suas múltiplas expressões: pobreza, desemprego, dicriminação, violência...Diante destas expressões e da permanente violação que estas crianças sofrem, verifica-se que ainda estas crianças não são vistos como sujeitos de direitos, condição afirmada na Constituição Federal de 1988 e ratificada no ECA 1990. Ainda se tornam como algo a ser atingido...

Anônimo disse...

Lancei meu olhar de Assistente Social na escola estadual onde faço oficinas semanais. E me pergunto como fazer? É dificil atuar em uma realidade que pouco se conheçe na qual o Processo de Trabalho do SS pouco adentrou.É um grande desafio! Crianças adultinizadas,maltratadas,meninas bonitas mas sem nenhuma oportunidade. Como fazer? Como lidar com esta realidade que causa repulsa e ao mesmo tempo instiga ao desafio do desconhecido? De um Processo de Trabalho pouco conhecido pela profissão.